sábado, 28 de junho de 2014

Adeus, Nico

Tudo começou com o fim.
O fim de um relacionamento, o fim da minha paz de espírito, o fim de quem eu era. De repente, eu estava em um poço de tristeza e angústia, uma tempestade de memórias, sensações e visões que confundia meus sentidos e eu quase pirei. Foi quando ele apareceu.

A gente já tinha se esbarrado algumas vezes no passado. Mas não era nada sério. Flertamos um pouco, trocamos uns beijos, ele me deu um pouco de paz... mas não chegou a marcar quem eu era, a definir meu comportamento, a me seguir aonde quer que eu fosse. Não até então. Quando eu estava em plena tempestade, o Nico apareceu. Foi tão gentil. Aquela tonturinha inicial que a gente sente quando tá gostando de algo ou de alguém; o friozinho na barriga e a falta de ar (na verdade eram náusea e crise de tosse, mas a gente é cego, né?) Ele me entendia! Era tão bom comigo. Me acalmava, me ouvia, entrava nos meus pensamentos.

Foi então que as coisas começaram a ficar um pouco assustadoras. Ele não largava do meu pé. Ou melhor, eu não conseguia ficar longe dele. De repente, comecei a viver em função dele. Meu dinheiro começou a ser gasto boa parte com ele, meus dias já começavam com ele, eu tinha que sair do meu local de trabalho periodicamente por causa dele. Virou uma obsessão. Eu não conseguia mais lidar com nenhuma situação normal de stress, ansiedade, dúvida, medo, tristeza ou alívio sem ele por perto.


Mas ninguém poderia me culpar. Quem resiste a isso? A alguém que está sempre ao seu lado, nos seus piores e melhores momentos, abraçando seu sistema nervoso, te fazendo pensar com mais clareza. E mais, dizem que não se pode confiar em ninguém, que ninguém vem com uma etiqueta na testa denunciando os males que faz, não é mesmo? Pois é! Até nisso o Nico era diferente. Ele vinha com uma estampa, cada dia diferente, alertando os riscos que eu estava correndo ao ficar com ele, e ainda por cima eram assinadas pelo Ministério da Saúde! Quer voto de confiança maior do que esse? Impossível.

Mas quando essa obsessão começou a causar danos, eu vi que era melhor dar um tempo. Eu já estava gastando dinheiro demais com ele, perdendo tempo demais, invadindo o espaço de pessoas que eu amo e que não aceitavam conviver com ele, decepcionando parentes e amigos.

Quem se relaciona com o Nico (ou com a Tina, dependendo da sua opção sexual) sabe do que eu estou falando. Quantas vezes você encontrou alguém de quem você gosta muito, e quis dar um abraço enorme nessa pessoa, ficar uns quarenta e sete minutos abraçado, mas não pôde, porque tinha acabado de dar um "pito" e estava fedendo? Quantas vezes você teve que conversar com alguém a metros de distância porque esqueceu o Trident e estava complexado com seu hálito? Quantas vezes você não saiu com seus amigos porque estava sem grana, mas o cigarro estava lá, do seu lado, te fazendo companhia na solidão? Quantas vezes você deixou de comprar algo que realmente queria porque ia ficar sem dinheiro pra comprar cigarro? Eu já sacrifiquei meu vale-alimentação por causa disso! E suas roupas? E seus dentes? E seus pulmões, caramba, os nossos perfeitos, límpidos e trabalhadores pulmões! E seus beijos, seus abraços, seus apertos de mão, os perfumes que você usa mas que não fixam porque são substituídos por cheiro de cinzeiro?

Então eu decidi parar. Chamei ele pra uma conversa séria.
- Acho que quero um tempo - eu disse.
- Um tempo? Essa é a história mais velha de todas - ele respondeu. - Vamos, dê outra tragada e repita isso.
- Não, Nico. Eu quero terminar.
- Mas por quê? Nós estamos tão bem. Nós nos completamos, nos amamos, somos tão companheiros.

Foi então que eu soltei aquela clássica. Desculpem, mas não havia outra forma.
- O problema não é você, Nico. O problema sou eu.

E era verdade. Eu sabia de todos os males que ele me traria. O problema era eu, e minha maneira de lidar com as minhas inseguranças, com as minhas tristezas, com as minhas ansiedades. Eu deveria arrumar outra solução para aquilo. Eu não poderia usar o Nico para o resto da vida, ou eu acabaria morrendo.

E foi assim. Decidi acabar com tudo. Como todo término, não foi fácil. Coloquei Marisa Monte pra tocar, piquei todas as nossas cartas, joguei tudo no lixo. A falta que ele me faz é absurda. Mas é necessário. A gente tem que aprender a se livrar de tudo aquilo que aparentemente nos faz bem, mas que, no fundo, a gente sabe que vai acabar nos matando, de uma forma ou de outra. Adeus, Nico. Adeus.

Este é o início da minha jornada para superar o Nico. Sei que não vai ser fácil, sei de todas as consequências, sei da dor, da abstinência, do desespero. Mas espero passar por isso da melhor forma possível e, quem sabe, ajudar outras pessoas a dizerem adeus a esse mal de que a gente precisa abrir mão para seguir em frente, mais feliz, mais saudável e mais cheiroso.

Compartilharei com vocês meu progresso, e espero que vocês também compartilhem sua experiência comigo! :)

1 comentários:

Carol Russo S disse...

Que forma interessante de descrever essa dependência.

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